Extratores urbanos e manejadores definem acordo de manejo florestal sustentável na Reserva Mamirauá

Publicado em:  1 de outubro de 2015

Contra a exploração ilegal de madeira, extratores urbanos do município de Uarini (AM) e manejadores de madeira florestal da Reserva Mamirauá estão se organizando para definir o regimento interno de um acordo de manejo florestal madeireiro. Nos dias 22 e 23 de setembro, foram realizadas reuniões para organização do acordo, que será o primeiro desse tipo na região e vai permitir o manejo sustentável e a comercialização legal de madeira entre as partes. Anteriormente, os produtos manejados eram comercializados para municípios localizados fora da Reserva.

O acordo será feito entre a Associação de Serradores e Moveleiros do Uarini e a Associação Comunitária Santa Luzia do Horizonte, da Reserva de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá. Em março deste ano, o Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam) concedeu a licença de operação para os manejadores, que tem validade de dois anos. O documento autoriza a exploração de quatro espécies, que foram selecionadas pelos extratores e comunitários, dentro da área determinada pelo plano de manejo: a abiurana, o açacu, o louro inamuí e o mulateiro. A autorização é para exploração equivalente a 168,601 m3 de madeira.

Desde de janeiro de 2014, os dois grupos vêm discutindo o acordo de manejo. Durante esse período, os representantes dos dois grupos estiveram envolvidos nos trabalhos de regularização das associações, participaram de treinamento e realizaram o levantamento de estoque da área que será manejada. Essas atividades foram acompanhadas pela equipe do Instituto Mamirauá, unidade de pesquisa do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, que presta assessoria técnica para a realização da atividade na Unidade de Conservação.

"O treinamento tem foco principal na legislação e normas de manejo florestal e na importância do uso de equipamentos de proteção individual, além da organização das associações envolvidas, que precisam estar regulamentadas para que o Acordo ocorra de maneira satisfatória. Depois, vamos para a parte de campo, para o levantamento de estoque", explicou Márcio Abreu, engenheiro florestal no Instituto Mamirauá. O levantamento de estoque é o momento em que as equipes delimitam a área de manejo e realizam o inventário das espécies florestais madeireiras de importância comercial, que já possuem o diâmetro de corte autorizado pela legislação.

Márcio ressalta que os trabalhos para realização do acordo, como é o caso dos diagnósticos dos municípios com interesse na iniciativa, vêm acontecendo há mais de cinco anos na Reserva, e destaca que a iniciativa tem grande potencial para a conservação do recurso madeireiro, além de se configurar como uma maneira de legitimação da atividade do extrator urbano.

Cácio Vidal da Costa nasceu e viveu na comunidade Santa Luzia do Horizonte durante grande parte da infância. Ainda jovem, ele e a família foram morar em Uarini, onde continuam até hoje. "Desde pequeno eu trabalhei com meu pai com madeira. Tirando madeira em tora, tanto para uso, como para comércio", contou. Atualmente, Cácio é um dos extratores urbanos de Uarini e faz parte da associação do município.

Cácio comentou o seu ponto de vista sobre a atividade do manejo florestal e do acordo entre os extratores urbanos e os que são moradores da Reserva. "A importância do manejo é que não vão derrubar madeira adoidado por aí, em todo canto. Nem derrubar árvore de qualquer grossura, ou de qualquer qualidade. Nessa área mesmo, a gente já não encontra mais uma árvore de cedro, ou de andiroba, como antigamente, já não tem mais. O manejo é bom porque a madeira sai mais bem vendida, mais valorizada, porque está tudo legalizado".

O engenheiro florestal do Instituto reforça que o acordo representa uma nova fase para a atividade do manejo florestal na Reserva Mamirauá. "É um formato promissor na relação entre o extrator da cidade e o rural, não só pelo compartilhamento do recurso natural de uma unidade de conservação, mas também pela articulação local. A iniciativa se reflete na oportunidade que é dada a esses trabalhadores de fazerem o manejo da forma correta, abrindo áreas legalizadas, tendo capacitações especializadas e orientações legais e jurídicas para a realização do manejo florestal, sejam moradores de dentro ou fora da unidade de conservação", completou.

Histórico

Embora as legislações que orientam sobre a exploração do recurso florestal madeireiro existam desde a década de 1960, a regulamentação da atividade na Amazônia é recente. O Manejo Florestal Comunitário só passou a ser reconhecido em 1998, por meio de um decreto do Ibama. E a instrução normativa para o manejo em ecossistema de várzea foi publicada em 2010, a partir dos resultados das pesquisas realizadas pelo Instituto Mamirauá e pelo Instituto Nacional de Pesquisa da Amazônia (Inpa) e das experiências dos manejadores da Reserva Mamirauá.

"A gente procura trabalhar sempre seguindo os três eixos da sustentabilidade: a parte econômica, que é o retorno que a comunidade tem e que ajuda a melhorar a qualidade de vida dessa população; a parte social, que é a organização deles para que o manejo florestal possa acontecer; e também a parte ecológica, que é trabalhar para que essa floresta dure por muito tempo", completou Márcio.

O manejo florestal comunitário é realizado na Reserva Mamirauá desde 1996 pelos moradores da área, com o apoio e assessoria técnica do Instituto Mamirauá. Esse trabalho conjunto foi possível tendo como base os resultados das pesquisas científicas realizadas desde 1993 na região. Esses estudos monitoraram as atividades de extração de madeira tradicionalmente executadas pelos comunitários, considerando características biológicas e socioeconômicas. Outra parte dos estudos foi mapear a cobertura vegetal e realizar o inventário para conhecimento das populações e distribuição das espécies madeireiras na Reserva.

Essas atividades fazem parte das ações do Projeto Participação e Sustentabilidade: o uso adequado da biodiversidade e a redução das emissões de carbono nas florestas da Amazônia Central (BioREC), financiado pelo Fundo Amazônia. 

Texto: Amanda Lelis

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