"A juventude não é o futuro do país, a juventude é o presente"

Publicado em: 22 de fevereiro de 2016

Raimundo Rodrigues Moreira, de 23 anos, foi um dos estudantes formados na primeira turma do Centro Vocacional Tecnológico (CVT) - Tecnologias Sociais da Amazônia, do Insitutto Mamirauá, unidade de pesquisa do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação. Entusiasmado, ele falou para o Instituto Mamirauá dos seus planos para a melhoria da comunidade onde vive, São Francisco do Aiucá, localizada na Reserva de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá (Am). Desde a conclusão do curso, o jovem já atua na comunidade, exercitando na prática os conhecimentos apreendidos. De acordo com ele, a expectativa é continuar contribuindo e futuramente se especializar em energias renováveis e propor melhorias para a geração de energia da região onde vive. Raimundo coloca a juventude como foco dos seus planos e propõe ajudar, junto com outros jovens, para a melhoria de vida e geração de renda na comunidade. Leia, na entrevista abaixo, o depoimento do jovem.

IM: Como foi o início do curso no CVT, como você se interessou por fazer parte da turma?

Raimundo: Estava terminando o ensino médio, foi uma forma que eu achei de não parar os estudos. Me interessei também porque era pra capacitar pessoas da Reserva que viessem a desenvolver trabalhos dentro da sua comunidade. Pra melhoria da qualidade de vida das pessoas. Era uma carência que a gente também sentia na capacitação dos jovens dentro da comunidade, não tinha essa oportunidade. Eu já trabalhava um pouco com a parte da organização da comunidade, mas não tinha nenhuma capacitação, foi da experiência que peguei com os mais antigos. Tanto pra mim, quanto pra comunidade, foi satisfatório. Eu pude aprender muito, aprendi coisas novas, também peguei uma boa noção de como escrever projetos, que tem uma carência na comunidade, não temos pessoas capacitadas pra escrever e enviar pra que venham os benefí­cios sociais pra comunidade. E pra comunidade em si, toda parte burocrática de documentação da comunidade, eu tive uma experiência boa em organização e hoje eu faço esse trabalho, foi a parte que eu mais gostei e eu pretendo seguir com isso e também com o meu projeto né, de energia solar.

IM: Qual foi a sua proposta de projeto de conclusão de curso?

Raimundo: Foi sobre tecnologias sociais. Eu vi que, por causa da organização da comunidade, o sistema (fotovoltaico domiciliar) daqui parou, era um investimento muito alto que estava parado há muito tempo, um investimento do Governo, em parceria com o pessoal da USP e do Instituto Mamirauá. Então, meu trabalho seria a revitalização dos sistemas. Minha proposta era revitalizar os 23 sistemas da comunidade, escrevi o projeto, fiz os testes do equipamento, pra ver o que faltava, o que é preciso comprar de equipamento.

Eles foram instalados em 2005, já tem mais de dez anos. Os sistemas ajudam a funcionar TV, ventiladores de pouca potência e lâmpadas. Mas a maioria das casas estão com os equipamentos bons, são poucos que estão danificados, o que está faltando é a bateria. E devido à falta da gestão do sistema, por falta de organização da comunidade, levou à paralisação do sistema, até porque para a família é muito caro.

IM: E como está seu projeto hoje?

Raimundo: Escrevi um projeto para captação de recurso e apresentei para um parceiro, estamos buscando financiamento, aguardando. Mas a gente ta com outros pensamentos ne, caso não venha o patrocínio, a comunidade tem força comigo e a gente vai buscar outras parcerias ou financiamentos para revitalizar os sistemas. Até porque é um patrimônio da comunidade que está fazendo falta. Infelizmente a gente sofre ainda com a falta de polí­ticas públicas para energia. Hoje são 67 famílias, agrupadas em mais ou menos trinta casas.

IM: Qual sua expectativa na comunidade para além desse projeto?

Raimundo: A expectativa é que, se Deus quiser, e esse ano der certo de revitalizar os sistemas, futuramente vamos tentar parcerias para implementar um sistema padrão que venha a suprir as necessidades das famílias, pra funcionar freezer, som, ventilador, liquidificador.  Também quero fortalecer o grupo de jovens da comunidade para que venha, através do grupo, buscar desenvolvimento tanto para melhoria de vida deles quanto da condição financeira. Os jovens das comunidades, querendo ou não, são meio que esquecidos pelos órgãos governamentais e são os futuros líderes das nossas comunidades. A juventude não é o futuro do país, a juventude é o presente. Até porque a juventude passa, e o futuro, a gente não sabe a quem pertence. Então, a gente tem que começar a investir nesses jovens que não têm tanto conhecimento, não conhecem bem as polí­ticas públicas, não sabem pra quem votam. Então, o grupo tanto desenvolve isso na comunidade como também vai buscar parcerias para implementar projetos dentro da comunidade que possam ser desenvolvidos ou servirem de modelo para polí­ticas públicas para as prefeituras, ou outros órgãos, que também venham a investir nas comunidades da Reserva.

IM: Você acha que essa sua ação e envolvimento na comunidade está dando resultado?

Eu acredito que sim. Porque muitos trabalhos que precisam fazer na comunidade, todos recorrem a mim. A parte de documentação, coisas que precisam de internet, até mesmo pra ajudar em inscrições em concursos públicos, os comunitários me procuram para pedir ajuda. E, na medida do possível, sempre tento ajudar.

IM: E quais tipos de trabalho você já fez? Depois do término das aulas, conseguiu aplicar na prática algum aprendizado?

Raimundo: Nossa associação estava meio carente, já tinham trocado presidente, mas no documento ainda era outro. Então eu fui, fiz a reunião, a gente fez uma ata, conseguimos trocar o presidente, junto com eles, e com a ajuda do pessoal do Instituto, do PGC (Programa de Gestão Comunitária), conseguimos reformar também o estatuto da associação. Conseguimos a regularização da Associação Comunitária São Francisco do Aiucá.

IM: E como você se enxerga daqui uns anos? Como você ainda espera contribuir para a região?

Raimundo: Aqui, dentro da Reserva, a gente não tem tanta possibilidade de estudar. As vagas que têm são na cidade. Meu pensamento é ficar aqui, estruturar esses jovens e depois fazer uma faculdade de engenharia elétrica, com foco em energia solar. Porque acho que não tenho que ajudar só a minha comunidade de origem, mas também as outras comunidades da Reserva. Porque não só a nossa, mas a maioria das comunidades daqui sofrem com esse mesmo problema, que é a energia. Nesse recurso a gente é rico: o sol. Pena que não dão a devida importância a essa riqueza que a gente tem, porque se caso eles fazem um investimento, contribuiria para a melhoria da qualidade de vida das pessoas e principalmente para melhoria do meio ambiente, que na comunidade diminuiria quase 80% da poluição, em função do uso do combustível nos geradores.

Por Amanda Lelis

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