Drones são precisos no monitoramento de botos em rios estreitos da Amazônia, mostra estudo

Publicado em: 31 de outubro de 2019

Veículos aéreos não tripulados possibilitam, entre outras coisas, maior precisão na diferenciação entre espécies dentro de grupos

Um artigo científico publicado recentemente na revista científica Oryx - The International Journal of Conservation, da Universidade de Cambridge, na Inglaterra, confirma e reforça as vantagens do uso de veículos aéreos não tripulados, os "drones", no monitoramento e geração de informações sobre os botos amazônicos. 

Segundo o artigo – que tem entre seus autores a pesquisadora Miriam Marmontel, do Instituto Mamirauá, e Marcelo Oliveira, biólogo do WWF-Brasil – os drones são um método mais barato e mais preciso de monitoramento dos botos amazônicos e permitem a distinção de espécies diferentes dentro de um grande grupo. Pelo método tradicional, que envolve simples observação com binóculos, a diferenciação é mais difícil de ser feita.

Além disso, os drones também permitem uma maior precisão na hora de correlacionar espécies e usos de habitats; e diminuem o índice de comportamento responsivo dos animais, já que causam pouca perturbação nos ambientes em que estão os botos. 

Expedição Ecodrones

Intitulado Effectiveness of Unmanned Aerial Vehicles for detection of Amazon dolphins (ou "Efetividade de Veículos Aéreos não tripulados na detecção de botos amazônicos", em tradução livre), o artigo científico traz informações detalhadas e as principais conclusões da Expedição Ecodrones, promovida pelo WWF-Brasil e pelo Instituto Mamirauá em 2016. 

Na ocasião, um grupo de cientistas percorreu 80 quilômetros do rio Juruá, no estado do Amazonas, para monitorar as populações de dois tipos de botos: o tucuxi (Sotalia fluviatilis) e o boto-cor-de-rosa (Inia geoffrensis). A expedição usou dois métodos de contagem dos indivíduos: a observação tradicional, com especialistas fazendo a contagem a olho nu ou com uso de binóculos, e a observação inovadora usando os drones. 

O objetivo foi comparar os números gerados pelos dois métodos e saber qual deles funciona melhor – ou, de maneira mais otimista, entender como os dois métodos podem trabalhar em conjunto para gerar informações científicas mais detalhadas e apuradas. 


Trajeto do drone sobre os rios acompanhado pelos pesquisadores (Foto: João Cunha)
Monitoramento ajuda na conservação das espécies de botos da Amazônia (Foto: Bernardo Oliveira)

Comparação

Dois drones foram usados na expedição. Eles ficavam a 20 metros de altura da água e a 50 metros de distância do barco onde estavam os pesquisadores - e conseguiam monitorar 100 metros do rio. As pequenas câmeras instaladas nos drones gravavam tudo que passava pela frente, gerando assim sete horas de filmagens. 

O material foi avaliado por três cientistas experientes que compararam as filmagens feitas com os drones aos resultados obtidos com o método tradicional de observação. Durante a incursão a campo, um grupo de cinco cientistas, posicionados à frente e atrás de um grande barco amazônico, fazia o monitoramento e registrava os avistamentos. 

Entre as descobertas, percebeu-se que os drones captam botos a 100 metros de distância (a observação simples chega a 300 metros) e que este raio de alcance poderia ser maior caso os drones possuíssem lentes mais potentes. Foram registrados, no total, 151 avistamentos, contabilizando tanto ocorrência de indivíduos isolados quanto de grupos (este número inclui os dois métodos de observação). A cada ocorrência, eram registradas a espécie, o tamanho do grupo e a presença ou não de filhotes.

Escala

Segundo a líder do Grupo de Pesquisa de Mamíferos Aquáticos Amazônicos do Instituto Mamirauá, Miriam Marmontel, o trabalho descrito no artigo apresenta uma nova metodologia, que pode ser adotada no monitoramento de populações em rios ou canais mais estreitos. 

"Hoje, a maneira como monitoramos mamíferos de água doce é cara e demanda muito recurso logístico.  É impossível cobrir a Amazônia toda desta maneira. Os drones, porém, estão cada vez mais baratos e fáceis de operar. Com a metodologia correta, os próprios gestores de unidades de conservação poderiam fazer essas contagens de botos, dando escala regional a este trabalho que fizemos", explicou Miriam.

O especialista de conservação do WWF-Brasil, Marcelo Oliveira, afirmou que a publicação do artigo reforça o compromisso da instituição com a Ciência e a geração de conhecimento sobre o bioma amazônico.

"O artigo comprova a eficiência do uso de drones na detecção de botos nos rios da Amazônia, mostrando que esse método possibilita a redução de custos, o aumento da efetividade do trabalho e a realização de pesquisas mais abrangentes nos rios", explicou o especialista.   

Integração sulamericana

O monitoramento de espécimes do Sotalia fluviatilis e do Inia geoffrensis faz parte da Iniciativa Botos da Amazônia (ou South American River Dolphin Initiative - SARDI, na sigla em inglês): um projeto interinstitucional que agrega diversas instituições em cinco países da América do Sul e que busca gerar informações e conhecimento cientí­ficos sobre os botos amazônicos. 

Estão engajados nesta tarefa diversas organizações do Brasil, Bolívia, Equador, Colômbia e Peru, como a Fundación Omacha (Colômbia), a FaunAgua (Bolívia) e a Pro Delphinus (Peru) e os escritórios WWF desses cinco países. 

Sobre os botos

Apesar de serem animais famosos e símbolo da Amazônia, existem poucos estudos com informações científicas consolidadas sobre os botos. 

Hoje, segundo a lista vermelha da The International Union for Conservation of Nature (IUCN/RedList), o boto-tucuxi (Sotalia fluviatilis) é classificado como um animal com "dados insuficientes" e o boto-cor-de-rosa (Inia geoffrensis) saiu dessa categoria apenas no final de 2018. Hoje, ele é considerado "em perigo" ("Endangered", em inglês). Este é o segundo nível de ameaça mais grave para um animal e indica que a espécie pode ser extinta num futuro próximo. 

Algumas das ameaças que incidem sobre os botos hoje são projetos de infraestrutura, como hidrelétricas (que cortam a ligação entre diferentes populações desses animais); a contaminação das águas por mercúrio vindo de garimpos de ouro; e a captura causada pela demanda de iscas para a pesca da piracatinga (Calophysus macropterus) em algumas regiões da Amazônia.

Acesse o artigo científico completo aqui.

Texto: Jorge Dantas/WWF Brasil 


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